Ao falar sobre mindset, logo me lembro da Síndrome de Gabriela. Ela se refere a pessoas que se recusam a aceitar a mudança como parte natural da vida. A expressão foi retirada de uma música do compositor Dorival Caymmi, chamada Modinha para Gabriela, que ficou imortalizada na voz de Gal Costa. A letra começa com a seguinte apresentação: “Eu nasci assim, eu cresci assim, eu sou sempre assim, vou ser sempre assim.”

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Todos nós já nos deparamos com “Gabrielas” no ambiente organizacional. Pessoas com opiniões fortes, concretizadas, que se recusam a aceitar a existência de novas maneiras de fazer as coisas. Ou ainda, continuam seguindo procedimentos que não fazem o menor sentido, custam caro e não agregam valor ao produto final. Afinal, elas argumentam: “as coisas sempre foram assim por aqui” ou “sempre fiz assim e ninguém nunca reclamou”.

Empresas são feitas de pessoas que colocam seus talentos e conhecimentos a serviço de objetivos funcionais, operacionais e estratégicos. Para isso, cada um traz uma bagagem, uma espécie de caixa de ferramentas, que muitos costumam chamar de “mindset” (em português, a tradução mais próxima seria “mentalidade”). Para cada problema, acionamos algumas ferramentas de nosso acervo e encontramos uma solução.

No passado, as ferramentas nunca mudavam e isso gerava uma sensação de conforto e segurança. Acontece que, já faz algum tempo, a tecnologia tornou obsoletas uma boa parte de nossas ferramentas. A forma como resolvíamos problemas ontem mudou. Tudo ficou mais rápido, eficiente e assertivo. Nesse contexto, o que fazer com nossa caixa de ferramentas?

 

Processos improdutivos

Em meu dia a dia de trabalho, acompanho a implantação de sistemas de gestão em clientes da Sankhya. A empresa que adquire nossas soluções sabe que mudanças serão necessárias, que alguns processos deixarão de existir, outros ficarão mais simples, alguns talvez demandem etapas complementares em relação ao que era feito anteriormente.

Normalmente quando iniciamos o processo de implantação, um dos desafios é lidar com o mindset dos colaboradores, que eventualmente se encontram apegados às práticas tradicionais e resistem às mudanças necessárias. Muitas vezes, são atividades que comprometem a produtividade da equipe e não agregam valor ao produto final.

Aprendi com o tempo a identificar as pessoas mais resistentes à mudança. Normalmente são profissionais experientes, que fazem as atividades há muito tempo da mesma maneira. Algumas vezes, foram os responsáveis pela criação daquele processo que será substituído por uma rotina automatizada. A resistência, nesse caso, é natural. Os gestores de projeto, quando se deparam com esse perfil, tem a responsabilidade de ajudar a transformar o mindset desses profissionais, mostrando como a tecnologia vem para ajudar, não para complicar ou comprometer os resultados.

 

Vítima ou agente das mudanças. Qual seu mindset?

Uma vez tive um líder que me ensinou algo importante. As mudanças virão. Isso é fato. Cada pessoa pode escolher como reagir a elas. Esse chefe me perguntava: você quer ser uma vítima ou um agente de mudança?. A vítima parece criar um laço afetivo relacionado à maneira como sempre fez as coisas. Seu mindset é rígido e precisa ser muito trabalhado para se abrir à mudança.

Já o agente de mudanças, mesmo que esteja acostumado com sua forma de agir, questiona sua efetividade e se mostra aberto a experimentar novas possibilidades. Muitas vezes, é ele mesmo que busca a mudança, ao perceber que está envolvido em atividades improdutivas ou que geram pouco valor.

A implantação de uma nova tecnologia eventualmente vai gerar desconfiança e resistência. Por isso, os responsáveis pela implementação tem que fazer um trabalho de convencimento interno, além de contar com o apoio do responsável dentro da empresa.

 

Ver para crer

Parece até engraçado, mas alguns profissionais agem como São Tomé. Sabe aquele discípulo que precisou encontrar com Jesus Cristo para acreditar que ele tinha mesmo ressuscitado? Ele precisava ver para crer. Quem é muito apegado ao seu modelo mental, age dessa maneira. Por isso, é preciso mostrar de forma prática quais os ganhos que o sistema trará, sejam eles operacionais, de tempo ou financeiros.

As resistências à mudança podem levar a atrasos no cronograma, erros de projeto e até perdas financeiras, uma vez que muitos projetos de consultoria são remunerados por hora de trabalho. Por isso, quando uma empresa se propõe a automatizar rotinas, ela precisa identificar os focos de resistência e preparar um projeto de gestão de mudança organizacional. É preciso deixar claro para todos os envolvidos quais serão os ganhos, vantagens e impactos. Nessas horas, a comunicação deve ser clara, objetiva e, se possível, vir acompanhada de exemplos positivos. Por exemplo, eliminar um processo improdutivo pode nos ajudar a ganhar um dia de trabalho.

Outra dica para esse processo é envolver os colaboradores nas etapas anteriores à aquisição de um novo sistema. Isso ajudará a identificar resistências e possíveis gaps na aceitação da nova tecnologia. Boicotes internos acontecem, infelizmente, e podem fazer com que a empresa perca tempo e dinheiro. Não se trata também de impor mudanças “goela abaixo”. É mais uma jogada de explicação, convencimento e comunicação contínua dos ganhos e vantagens da mudança.

Implantar um sistema de gestão da maneira correta envolve tempo, dinheiro, conscientização e mudança de mindset. Quem ficar parado no tempo, usando sempre as mesmas ferramentas, como nossa amiga Gabriela ou nosso velho São Tomé, pode até atrasar a mudança, mas não impedirá que ela aconteça.

Por isso, que tal abrir sua caixinha de ferramentas, descartar o que não serve mais e abrir espaço para a transformação das organizações? Nosso mindset tem uma grande capacidade de se adaptar. Basta a gente querer.